domingo, 5 de setembro de 2010

Dom Casmurro - lembretes...

Olá a todos,

Lembro, então, as três principais linhas de leitura desde a publicação do livro:

No passado até década de 1960:
a história de uma dupla traição narrada pelo marido traído.

A partir da década de 1960:
romance de uma suspeita.

Leitura contemporânea (Roberto Schwarz; Luiz Roncari):
Bento Santiago não é um narrador confiável e seu romance é um libelo acusatório.

Em frente... sem mais reticências!
Volto à "cena" em que Bentinho "desesperado" janta e vai ao teatro ver..."Otelo" (vamos a trecho e comentário, ok?):

"Jantei fora. De noite fui ao teatro. Representava-se justamente Otelo, que eu não vira nem lera nunca; sabia apenas o assunto, e estimei a coincidência. Vi as grandes raivas do mouro, por causa de um lenço —um simples lenço!— e aqui dou matéria à meditação dos psicólogos deste e de outros continentes, pois não me pude furtar à observação de que um lenço bastou a acender os ciúmes de Otelo e compor a mais sublime tragédia deste mundo. Os lenços perderam-se. Hoje são precisos os próprios lençóis; alguma vez nem lençóis há e valem só as camisas.
Tais eram as idéias que me iam passando pela cabeça, vagas e turvas, à medida que o mouro rolava convulso, e Iago destilava a sua calúnia.
Nos intervalos não me levantava da cadeira - não queria expor-me a encontrar algum conhecido. As senhoras ficavam quase todas nos camarotes, enquanto os homens iam fumar. Então eu perguntava a mim mesmo se alguma daquelas não teria amado alguém que jazesse agora no cemitério, e vinham outras incoerências, até que o pano subia
e continuava a peça. O último ato mostrou-me que não eu, mas Capitu devia morrer. Ouvi as súplicas de Desdêmona, as suas palavras amorosas e puras, e a fúria do mouro, e a morte que este lhe deu entre aplausos frenéticos do público.
— E era inocente, vinha eu dizendo rua abaixo;— que faria o público, se ela deveras fosse culpada, tão culpada como Capitu? E que morte lhe daria o mouro?Um travesseiro não bastaria; era preciso sangue e fogo, um fogo intenso e vasto, que a consumisse de todo, e a reduzisse a pó, e o pó seria lançado ao vento, como eterna extinção..."

Bom, conforme vimos conversando...veja bem, não é?
a) pouco usual um homem culto de final do Século XIX não ter lido nem visto representada em Teatro o "Otelo".
b) ele está péssimo, mas janta e vai ao teatro? precisava dar a receita... tudo bem, já entendi, tem gente assim, mesmo. Mas, que tipo mesmo de pessoa?
c)o último ato "mostra" a ele que Capitu deve morrer - uma pessoa com discernimento e sensatez, ademais um homem de cultura, sabe que há a necessidade de distanciamento entre o que você vê representado e a sua vida. Não é como esses desavisados que, ainda hoje, levados pela emoção, andam aí a emboscar malvados de telenovela distribuindo bordoadas (nem preciso falar nisso, está todos o dias na internet - ator ou atriz que faz papel de malvado(a) a levar desde guarda-chuvadas até tapas).
d)o público em sua narrativa - elaborada muitos anos depois do ocorrido e que portanto deveria usufruir da serenidade da maturidade - aplaude não o trabalho dos atores mas a cena em si, a morte (injusta) imposta a Desdêmona por Otelo!

E então, dá panos para as mangas, hem?

Final do livro:

“O resto é saber se a Capitu da Praia da Glória já estava dentro da de Mata-cavalos, ou se esta foi mudada naquela por efeito de algum caso incidente.” (Dom Casmurro).

E alguns questionamentos:

1) Todo o mundo que já sofreu decepções com pessoas que pensava conhecer e com as quais conviveu longo tempo pode ter esse tipo de reflexão;

2) E D. Casmurro, será que aquele cara que - parece que concordamos - é no mínimo problemático, já estava lá, dentro do Bentinho inocentinho que pensava em pedir ajuda a D. Pedro II para não ir ao seminário? Ou aquele anjinho (ladeado por uma menina bem mais prática e "esperta") é uma criação do rancoroso D. Casmurro?

Por fim, vamos ao início do romance - D. Casmurro nos diz lá no início da narrativa para não procurar "casmurro" em dicionário - pois o seu apelido é dado no sentido que conferiu o "vulgo" de indivíduo "calado e metido consigo".
Então vamos fazer o que disse para não fazer, certo?
Casmurro - dicionário Houaiss:

n adjetivo e substantivo masculino
1 diz-se de ou indivíduo teimoso, obstinado, cabeçudo
2 diz-se de ou indivíduo fechado em si mesmo; ensimesmado, sorumbático

Pois bem, a segunda acepção é mesmo a que ele diz, mas e a primeira? Teimoso, obstinado, cabeçudo?
O que se pode fazer com essa informação? Ler...Hummm!
Aguardo postagens!
Abraço
Susana

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